Foi assim que percebi meu primeiro contato com Flymoon® , técnica desenvolvida por Clara Faria Trigo que trabalha com a instabilidade do corpo, ou, as instabilidades corpóreas.

Meu corpo há algum tempo procurava algo que o impulsionasse, instigasse, que o fizesse atravessar barreiras. Antes de me debruçar neste pequeno depoimento quero tornar público minha admiração de longe e oculta por Clara Trigo, desde que tive contato com uma de suas obras no Rumos Dança Itaú Cultural de 2006 quando assisti ao seu solo Deslimites embalado pela trilha sonora de Arnaldo Antunes. Na época eu participava do evento como artista pré-selecionado com a pesquisa Pele e Ossos. Nossa agenda semanal dentro do evento era um encontro todas as manhãs com outros artistas também pré-selecionados sob a orientação de artistas “renomados” como Marcelo Evelin, Vera Sala e Paulo Paixão, com o objetivo de compartilhar nossas inquietudes e colocá-las em discussão, na “berlinda”. Nesses encontros um dos exercícios cotidianos era comentar os espetáculos da noite anterior. Ao ser indagado com a famosa pergunta clichê e entediante: O que vocês acharam do espetáculo Deslimites de Clara Trigo? Confesso que nesse dia eu estava ansioso por essa pergunta e respondi sem pestanejar. Na lata…

“Eu queria estar fazendo o que ela faz!”

Quase todos olharam pra mim com um olhar de descontentes, chegava a ser de reprovação. O que eu lia nos olhos dos outros era: “Como ele pode? Quanta pretensão!” Um dos orientadores me perguntou: E por quê não fez? Ora, ora… Talvez agora um pouco menos imaturo eu tenha a oportunidade de explicar. Vamos nessa!

Clara, fazemos parte de mais uma geração de inquietos. De não satisfeitos com a “normalidade”. Nesse lugar dilacerante de instabilidade e principalmente de incertezas. Em 2006 eu estava preocupado com os ossos, articulações, pele, tendões, ligamentos e, por conta disso, talvez eu tenha percebido similitudes em nossas pesquisas. Eu identifico semelhanças no corpo que foi construído para Corpo – Massa: Pele e Ossos e o corpo de Deslimites. Me perdoe a pretensão!

Mas por que puxar pela memória tantas lembranças para poder falar sobre Flymoon®?

Só acho que caminhar por esse mar de incertezas na dança nos faz traçar congruências com outros anseios que não imaginamos. Deve ser nosso insconsciente que “fala mais alto”. (Salve Leonard Mlodnow!)

Vou tentar chegar lá. O fato de tanto pensar em ossos, articulações, etc. etc. me fez pensar nos músculos de uma forma secundária. Ou seja, passei a entender os músculos como elásticos que nos ajudavam na locomoção, mas não eram o motor principal. Esse pensamento, apesar de ter sido motor para algumas criações e salutar para o desenvolvimento da pesquisa, após algum tempo de trabalho se tornou prejudicial para algumas partes do corpo extremamente importantes. Como as articulações dos ombros, dos joelhos e o trabalho de fortalecimento da musculatura do abdômen ficou um pouco comprometido.  Isto posto dentro do trabalho que realizamos na Cia. Etc., estávamos em uma procura, por vezes inconsciente e utópica, de um caminho que pudesse trabalhar o corpo em sua “totalidade”. Estamos sempre à procura de desafios e enfim acho que encontramos(ei). Aqui abro um parêntese, para continuar preciso explicar como entrei em contato com esta nova aventura.

Faço parte da Cia. Etc. e nela somos quatro integrantes, eu, Marcelo Sena, Elis Costa e Renata Vieira, todos sedentos por informações e provocações que nos façam mover essa máquina que se chama dança. Mês passado Marcelo Sena fez uma formação com Clara Trigo chamada Flymoon® e foi assim que nós da Cia. Etc. entramos em contato com este novo “andar na lua”.

Caminhadas na Lua, Tatu bola, Meia embreagem, Túnel, Puleiro, etc. Que massa!

Então aqui narrarei alguns benefícios sobre “Andar na Lua”.

Fortalecimento do centro, região abdominal, em sua totalidade. Principalmente trabalhando duas musculaturas importantes que raramente trabalhamos. Os oblíquos internos e externos de forma intensa. Os exercícios de flexão lateral do tronco são os mais eficazes. Os do Barquinho por exemplo. Outro benefício foi o trabalho de uma região que pouco conseguimos trabalhar de forma consciente, primeiro a ativação do períneo, musculatura localizada entre o órgão genital e o ânus. Segundo a porção inferior do reto abdominal, entre o umbigo e o púbis, terceiro o transverso (nosso espartilho natural). Os quadrados lombares e os extensores da coluna também são bem solicitados. Essas musculaturas são todas exigidas e trabalhadas de forma eficaz. Porém senti falta de trabalhar essas musculaturas em consonância com a mobilidade do esqueleto axial como um todo. Essa “falta” talvez tenha se dado pelo fato do pensamento que foi construído em Pele e Ossos, que era de pensar todos os movimentos através dos ossos e articulações.

Alguns benefícios foram já percebidos: as dores na região lombar e nos joelhos cessaram.

Outro ponto importante foi perceber a ativação de toda musculatura postural principalmente nos exercícios de equilíbrio em pé em cima do Flymoon® e com o tronco fletido para frente fazendo a flexão do quadril. Uma musculatura ao redor dos joelhos ficou mais aparente. Não consigo identificar ainda se é o vasto medial (intermédio) do quadríceps ou o sartório.

Os exercícios de mobilidade dos ombros são muito bons, porém, durante a execução prefiro pensar em ossos e articulações do que em alguma musculatura específica. Os exercícios de alongamento “passivos” também são bem interessantes.

No momento estou nesse lugar de descobertas, de um grande desafio corporal, algo que se apresenta pra mim a cada dia como novo, instigante. Clara, você deu instabilidade a nossos ossos e articulações. Muito obrigado!

Jr